Sempre tive comigo um grande desapontamento: nunca tive inimigos. Alguns pequenos desafetos apenas, antipatias gratuitas, mas nunca inimigos. E todas as vezes em que via alguém reclamando de falsidade e dizendo que não podia confiar em ninguém, confesso que sentia uma pontada de ciúme. Aquelas pessoas eram tão incríveis que, além de merecer todo amor e admiração do mundo, eram dignas de ódio. Suas vidas eram infernizadas por vilões misteriosos. Nas ruas, eram perseguidas por paparazzis.
Que vidinha medíocre era a minha que não despertava sequer a inveja de um ou dois anônimos? Precisava de um inimigo. Mas não queria ter de conquistar um, ele deveria vir de maneira natural, como um urubu farejando podridão (oh!). Analisei potenciais adversários - verdade, não eram muitos -, prestei atenção ao meu redor - segundo os odiados, sempre há uma cobra próxima pronta a dar o bote. Infelizmente, minha busca foi frustrada. Ninguém parecia querer espalhar intrigas a meu respeito, puxar meu tapete, me sabotar. Todos a minha volta tinham sorrisos amáveis e bons corações - nem tanto. Hoje sei que os pobres perseguidos sofrem de uma grave síndrome que tem como sintomas mania de perseguição, egocentrismo, megalomania; podendo chegar, em alguns casos já avançados, à esquizofrenia.
Continuo sem inimigos. Pelo menos, nenhum de que tenha conhecimento. Entretanto, com muito esforço, pude suprir essa falta com um tanto de bons amigos. Considero-me curada. Mas é preciso ter cuidado. Afinal, o lema é um dia de cada vez.