No início, era um dom natural, aptidão. Como quando a criança de dez anos ganhou o prêmio de melhor redação. O tema era meio ambiente, e a corretora confirmara: a obra estava em nível de ensino médio, na quarta série. Um prodígio! Mamãe ficara contente com o ano de mensalidades grátis.
O tempo passava - sempre passa, involuntariamente - e nenhum best-seller havia sido escrito pelo pequeno gênio. Tentou manter um diário, o qual não durou muitos meses. Muitos anos depois, mais um prêmio, mais um tema policamente correto qualquer e nenhuma esperança de uma promissora carreira literária. O mundo é mesmo um moinho e, se você não fica atento, tritura seus sonhos tão mesquinhos sem piedade alguma.
O que antes ousou-se chamar de aptidão, hoje não passa de mera facilidade. Nada muito além disso. Simples capacidade de ordenar palavras, e uma incompetência enorme em expressar qualquer sentimento, do mais grandioso ao mais banal. Nenhum orgulho, apenas a estranha necessidade de pôr no papel (?) o que insiste em não ser esquecido. Se ainda escrevo, é porque não tenho dinheiro para um analista.